15 de março de 2015

Por que Tomé duvidou?

Estigmatizar: “Condenar; marcar uma pessoa negativamente ou de modo desagradável”.

Com frequência estigmatizamos as pessoas. Tomé é marcado como aquele que não creu. Uma marca capaz de adjetivar as pessoas até os dias de hoje. Mas será mesmo que Tomé é aquele que duvidou? Ou melhor, é justa essa marca?

Preâmbulo: Logo pela manhã Maria Madalena vai ao túmulo onde Jesus foi enterrado, vê que a pedra foi removida e corre para avisar a Pedro dizendo: “Eles tiraram o Senhor do sepulcro, e não sabemos onde o colocaram!” (Jo 20.3). Pedro e João correm até o local. Pedro entra, vê as faixas, mas o corpo não estava mais lá. Quando João entrou “viu e creu.” (Jo 20.8). Maria continuou do lado de fora chorando até que o próprio Jesus lhe apareceu. Então ele disse: “... vai, e ao encontrar meus irmãos, dize-lhes assim: ‘estou ascendendo ao meu Pai e vosso Pai, para meu Deus e vosso Deus’” (Jo 20.17). Ela foi e fez conforme Jesus lhe havia dito.

É nesse contexto que encontramos a história que estigmatizou Tomé como aquele que precisa ver para crer.

No Evangelho de Mateus não encontramos detalhes do que sucedeu depois. Mas, segundo Evangelho de Marcos, “ela foi e comunicou aos que com Ele tinham estado. Eles, porém ... Quando receberam a notícia de que Jesus estava vivo e fora visto por ela, não conseguiram acreditar” (Mc 16.9-11). O Evangelho de Lucas é ainda mais enfático. “Entretanto, eles não acreditaram nelas, as palavras daquelas mulheres lhes pareciam um delírio” (Lc 24.11).

A bem da integridade do texto, no Evangelho de João não há uma referência clara a esse respeito: se eles creram ou não nas palavras de Maria Madalena. Contudo escapa um comportamento, no mínimo estranho, quando Jesus aparece aos discípulos. “Enquanto falava aos discípulos, mostrou-lhes as mãos e o lado. Então os discípulos ficaram muito alegres ao verem o Senhor” (Jo 20.20).

Dois detalhes chamam a atenção. Primeiro, sobre o que os discípulos falavam quando Jesus mostra as mãos e o lado? Segundo o texto, somente após este ato – então – eles “ficaram muito alegres”. O detalhe mais forte desta frase está em “ao verem ao Senhor”. Ora, o Senhor já não estava entre eles? Por que “ao verem”? Já não o estavam vendo?

Segundo, por que Jesus mostra as mãos e o lado aos seus discípulos? Não é essa atitude que vai estigmatizar Tomé como quem precisa ver para crer?

Ato contínuo, os discípulos anunciam a Tomé que estiveram com o Jesus, porquanto ele não estava com eles naquele dia. A resposta de Tomé é conhecida. “Se eu não vir as marcas dos pregos nas suas mãos, não colocar o meu dedo onde estavam os pregos e não puser a minha mão no seu lado, não acreditarei” (Jo 20.25). Aqui fica claro que as provas que Tomé precisa para crer na ressurreição são as mesmas protagonizadas por Jesus no encontro anterior.

Pensando neste contexto onde os discípulos passaram de um grande momento de dor para uma alegria extasiante, e considerando a ausência de Tomé no primeiro encontro, eu ousaria acrescenta a afirma de Tomé a palavra “também” sem muitas dúvidas. Caberia perfeitamente começar a frase com: “Se eu [também] não vir as marcas dos pregos nas suas mãos ...”. De todo modo tocar as mãos e o lado é a forma de Jesus provar que está vivo.


Finalmente o texto o qual estigmatiza Tomé. Depois de oito dias Jesus faz tudo igual: chega, anuncia a Paz e mostra as mãos e o lado para Tomé porque ele não cria. Então Jesus diz: “Tomé, porque me viste, acreditaste? Bem-aventurados os que não viram e creram!” (Jo 20.29).

Numa análise muito severa podemos afirmar que Jesus se refere claramente somente a Tomé. E isso pesa contra ele. Se, contudo, usarmos a mesma severidade que pese a seu favor que ele foi o único a reconhecer Jesus como Senhor e Deus. “E Tomé confessou a Jesus: ‘Meu Senhor e meu Deus!’” (Jo 20.28).

Numa análise menos rigorosa a partir da natureza humana – limitada à razão, aos sentidos e com grande dificuldade em compreender a grandeza de Deus –, não seria absurdo pensar que Tomé foi apenas isso, humano. Como os outros, ele não creu nas mulheres. Talvez o seu diferencial seja não ter crido no testemunho dos amigos. Mas será que eu e você teríamos crido estando neste mesmo contexto? Será que isso justifica a “marca” de Tomé?

O Evangelho de João é o mais teológico dos quatro. E, a frase que encerra essa narrativa é absolutamente clara:
“Verdadeiramente Jesus realizou, na presença dos seus discípulos, muitos outros milagres, que não estão escritos neste livro. Estes, entretanto, foram escritos para que possais acreditar que Jesus é o Cristo, o Filho de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em Seu Nome” (Jo 20.30-31).

Portanto, Tomé sou eu, Tomé somos nós quando precisamos ver para crer e quando duvidamos da Escritura, a qual foi registrada pelo Apóstolo João para que pudéssemos crer que Jesus é o Cristo, nosso Senhor e nosso Deus.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Agradeço por seu comentário. Volte sempre.

Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...