30 de março de 2013

Um estranho jantar

Havia um estranho silêncio naquela noite de primavera. Aquele parecia ser mais um encontro deles com seu grande amigo, assim como tantos outros, mas algo diferente pairava no ar. Que noite estranha aquela! O que a fazia diferentes de todas as outras? Seria a tradicional festa que se avizinhava? Seria alguma nova revelação? O amigo tinha um olhar distante e melancólico. Por quê? Será que algo o afligia? O que seria? De repente um deles sai às pressas com um semblante ainda mais estranho.

Então bem no meio do jantar Ele fez algo diferente e tudo começava a se revelar. Tomando o pão em suas mãos deu graças e disse as mais estranhas palavras já ditas até então: “Tomai, comei; isto é o meu corpo que é partido por vós; fazei isto em memória de mim.” O que elas significavam? Olhavam-se atônitos sem que houvesse em nenhum deles coragem bastante para perguntar-lhe. Seu olhar era de profunda tristeza. Ficou a dúvida e o silêncio sepulcral.

Uma vez mais ele quebrou o protocolo. Tomando o cálice com vinho deu graças outra vez e disse: “Este cálice é o novo testamento no meu sangue, que é derramado por vós.” Essas palavras lhes calaram ainda mais fundo. O medo começava a tomar conta dos seus corações. Homens experimentados nos vários momentos vividos com Ele, o Mestre.  Entreolhando-se perceberam que aquela noite, aquele jantar tinha algo de muito estranho, mesmo para eles.

Afinal, qual o sentido destas coisas?

Num terceiro ato o Mestre os surpreendeu mais uma vez. Tomou uma toalha e uma bacia e pôs-se a lavar-lhes os pés. Na verdade constrangeu-os a que lhes lavasse. Definitivamente o Mestre estava mais estranho e misterioso naquela noite e nada parecia fazer sentido.

O que sucedeu em seguida foi só suor, lágrimas, sangue e dor. Muita dor. Aquela noite, aquele jantar era uma despedida. Não o veriam novamente, pensavam consigo. O Mestre estava morto e tudo estava acabado. Esse era o sentimento dos que o conheciam e o amavam. Estavam literalmente quebrados, sem esperança ou orientação. “vou pescar”.

Certamente aqueles dias foram difíceis, dias de grande reflexão, dias de lágrimas. Tudo o que viram, ouviram e fizeram juntos; alegrias, tristezas e desavenças e tudo tão intenso não mais havia. Não o tinham mais por perto e nada mais fazia sentido. “vou pescar”.

Fico pensando no pesar daqueles homens com a perda de alguém tão especial como Jesus. Aquela noite nunca mais sairia das suas mentes. A noite em que se despediam de seu grande amigo sem saber.

Naquele caso uma grande alegria ainda os aguardava, Ele ressuscitaria. Mas na nossa vida nem sempre é assim. Um dia, uma noite, um momento, pode ser o último. Tantas palavras ditas, que não deveriam, outras não ditas, que deveriam. Tanta “força”, tanta necessidade de vencer, de chegar primeiro, de superar a si, de superar o outro. Isso tudo para quê? E se for essa a última vez? Se for o último encontro? Será que vale a pena? Talvez não haja outra chance de retornar, de pedir perdão, de despedir-se. Talvez as lembranças fiquem na memória para sempre daquele momento que não voltará nunca mais.

“Como as crianças hierosolimitanas contemporâneas de Jesus, preciso ser vulnerável. Abraçar minha fraqueza, finitude e fugacidade. Insignificar-me. Substituir autonomia por liberdade em uma temporária, e depois voluntária (mas sempre saudável e amorosa), dependência do Pai, que me alimenta, protege, cuida, ensina e acarinha.”*

* https://prazerdapalavra.com.br/criancas/3410--ser-como-uma-crianca-dercinei-figueiredo-.html

2 comentários:

  1. Jesus através de Suas metáforas nos ensina algo que deveria ser simples na forma, mas este algo se torna profunda no conteúdo. Tornar-se criança, talvez seja o estado mais difícil de alcançar. Vivemos, desde o dia em que nascemos, buscando ser independentes e autonômos.''Insignificar-se'' não faz parte da mente terrena.

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    Respostas
    1. Querida irmã,

      Obrigado pelo comentário.

      Com carinho e saudades,

      Leonardo Martins.

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Agradeço por seu comentário. Volte sempre.

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