Sem grandes preocupações exegéticas, hermenêuticas, históricas etc., apenas o texto pelo texto. Chame como quiser:
insight, sensibilidade, revelação ou de pura intuição.
“... unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda.” (Salmos 23,5b)
Debruçando-me sobre este pequeno trecho a questão sempre foi a mesma: Por quê? Por que o cálice transborda?
1 – Temos dois elementos (substantivos) centrais: óleo e cálice
2 – O segundo, o cálice, transborda
3 – O primeiro, o óleo, é transbordado.
Por que o cálice transborda?
Inferência sobre o cálice. 1 – Tem formato definido; 2 – Tem um volume mensurável; 3 – Pode estar no máximo cheio e no mínimo vazio; 4 – Não pode reter mais que sua capacidade.
Inferências sobre o óleo. 1 – Não tem formato definido; 2 – Não tem volume mensurável (não no texto); 3 – Não conhecemos o seu máximo ou mínimo; 4 – Não pode ser retido pelo cálice.
Perguntas movem as mentes e esta estava equivocada. Porque não é o cálice quem transborda. É o óleo que extrapola o cálice! No início ele se amolda ao primeiro – até o limite da borda – depois o ultrapassa para além dos limites e definições até assumir seu real formato (sem forma definida). Ora, se transborda é porque preencheu totalmente o cálice por dentro e, agora, o recobre por fora. Mais, ele ganha um novo espaço. Ele, o óleo, se derrama. Começa por se derramar dentro até chegar o momento de se derramar também fora dele.
O cálice, visto de fora, – se for opaco – não se pode saber se está cheio, vazio ou em processo. Somente o próprio cálice sabe a quantidade de óleo nele contida. Contudo, ele não consegue reter todo o óleo porquanto seu volume é menor. Ele consegue, no máximo, reter o primeiro à sua própria medida e moldá-lo a seu próprio formato. Depois... depois o óleo lhe escapa, o envolve e se esvai. Trasborda sem controle, sem formato, sem medida.
Conclusão: O cálice só pode estar cheio/vazio, é limitado e tem forma definida. O óleo, não cabe no molde do cálice, é maior que ele e não tem forma definida. Além disso, é fluido, viscoso e antiaderente. É ele quem se faz transbordar e não aquele.
É só uma tese carecendo de aprofundamento, admito. Mas segundo o pressuposto, o texto pelo texto, é o que pude intuir. Claro, somente após mudar a pergunta para. Por que O ÓLEO transborda o cálice? Faz mais sentido, não?